Por Vanessa Martina Silva, publicado originalmente no Brasil de Fato.
Neste domingo (13), se estivesse vivo, Fidel completaria 91 anos. Viveu por exatas nove décadas, sendo testemunha dos maiores acontecimentos políticos do século 20 e ator fundamental da luta que impactou definitivamente a história da América Latina: a Revolução Cubana. Assim como o tempo em que viveu, Fidel é complexo e ao falar sobre ele, corre-se o risco de cair no simplismo de tratá-lo como herói ou como bandido.
Sem a pretensão de esgotar o assunto ou de falar sobre Fidel com qualquer falso distanciamento objetivo, procuramos Ernesto Nascimento e Cláudia Furiatti, dois brasileiros que moraram em Cuba e, à sua maneira, estiveram próximos dele. Eles conversaram conosco sobre a imagem que têm do líder cubano e do legado que fica após sua morte, em 25 de novembro de 2016.
Mas antes, te convidamos a ouvir o radiodocumentário sobre a Rádio Rebelde, emissora criada em Cuba por Fidel e Che Guevara em plena guerrilha na Serra Maestra, nos idos de 1958, e que foi fundamental para a vitória da Revolução Cubana. Ouça abaixo. Por Beatriz Pasqualino.
A Biógrafa
Uma das razões para isso é a “pressão enorme que ele sempre sofreu de uma contrapropaganda. Algumas [informações] talvez tivessem algum tipo de relação com a realidade, dependendo do ponto de vista, mas muitas acusações foram muito exageradas e manipuladas”, avalia Cláudia, em conversa por telefone com a reportagem. Dessa forma, complementa, “toda essa ofensiva que ele sempre sofreu, foi desgastando a imagem dele”.
Quanto à vida dos cubanos sem Fidel, ela trabalha a ideia de “ausência presente”, tal como o conceito é abordado pela psicanálise. O termo é usado, explica Cláudia, quando “uma pessoa é tão forte que mesmo ausente continua te guiando, aparecendo de alguma forma no teu caminho”.
Fidel caminhava pelas ruas de Cuba, entrava em repartições públicas para conversar com funcionários, ia a faculdades ouvir os estudantes. Esse fato “faz com que eles sintam falta não como uma imagem, uma coisa distante ou platônica, mas como se fosse um pai presente”.
“E qual o legado de Fidel?”, questiono. “Eu sinto falta, pessoalmente, de um sinal de esperança, de mudança. Mudança que tire as pessoas da exclusão, que acabe realmente com a opressão, com as injustiças, com a corrupção, com a indecência. Eu acho que esse é o legado de Fidel. Ele não abriu mão disso, de ser um mensageiro da liberdade dos povos, da igualdade, do diálogo entre os povos. Ele foi um anti-imperialista até o fim da vida”, afirma a jornalista.
E complementa: “eu convidaria as pessoas para lerem as coisas que ele escreveu, porque realmente são uma injeção de esperança e de vontade de lutar”, diz Cláudia com a propriedade de quem leu todos os discursos e escritos de Fidel.
O mais jovem preso político do Brasil
Para entender a relação de Ernesto Carlos Dias do Nascimento com Cuba e com Fidel Castro, é preciso antes recuperar sua história e trajetória.
Seu nome é uma homenagem a Che Guevara, assassinado na Bolívia um ano antes de seu nascimento, e seu apelido é uma espécie de agradecimento à pátria que o acolheu após ter sido banido do Brasil, aos dois anos de idade, acusado de ser terrorista e subversivo. Conhecido como Ernesto Cubano, hoje com 49 anos, passou a infância e adolescência na ilha socialista e tem, na figura de Fidel um pai, como conta, emocionado.
Emoção é, aliás, algo que esteve muito presente na quase uma hora que conversamos com ele. Logo de início, Ernesto explicou que teve muita dificuldade de contar sua história para a imprensa nas primeiras vezes e que, inclusive, quando teve que prestar depoimento à Comissão da Verdade, em público, não conseguiu e o fez depois.
O Fidel que vemos retratado sempre pelos jornais, revistas e televisão não corresponde àquele que Ernesto conheceu em seus 16 anos morando em Cuba. A imagem do comandante “foi muito distorcida, criminalizada pelos grandes meios de comunicação. Chamam um grande líder popular de ditador e aqui chamam ditador de presidente”, critica.